terça-feira, dezembro 05, 2006

Gata Poderosa


Chan Marshall a fechar o festival da Radar, a tal rádio da malta que gosta de se auto-proclamar indie. A única rádio que eu consigo ouvir.
Cenário: Ela, Cat Power, e a sua banda de meninos que sabem muito daquilo que fazem, no palco da Aula Magna. Lotação esgotada por uma multidão que esperava este dia à muitos dias.
Acontece neste tipo de concertos a malta ir cheia de expectativas. Nos dias que antecedem o evento fantasia-se n vezes aquele minuto em que a voz da menina Cat vai fazer os pêlos dos braços terem uma valente erecção ou aquele momento em que se tem certeza de que não existe mais ninguém na sala e nesse instante apenas apetece ficar ali imóvel a fitar a diva que canta para nós.
Enfim...e depois acontece o que aconteceu e a malta vem cá para fora dizer que é falta de profissionalismo...que foi um dia mau...etc e tal!
Certo? Não!! Errado...
Acontece o seguinte: toda a gente sabe, ou pelo menos devia saber, que a acústica da Aula Magna é uma grande merda; toda a gente sabe, ou pelo menos devia saber, que a menina Cat é cheia de surpresas; e claro, há toda uma parafernália de equipamento (amplificadores, mesas cheias de botõezinhos, colunas, fios, instrumentos teimosos, microfones, eu sei lá mais o quê...) sempre pronto a querer estragar o profissionalismo do artista e a querer transformar um concerto naquilo que parecia ser um ensaio geral de um concerto...!
Enfim...e depois há malta que sai desanimada...Porque estava à espera de mais...Porque ela até interrompeu uma música a meio...porque isto e aquilo...
Mas afinal o concerto foi mau?
Não!! Foi dos muito bons!!
Foi inesquecível...teve momentos mágicos...espontâneos...verdadeiros...sem ensaios...
Ok...a Aula Magna foi realmente merdosa...
Se bem que, ao fim de dez minutos, eu já não estava propriamente na Aula Magna.
Enfeitiçado pela voz da menina Cat, estava numa qualquer tasca bafienta do Bairro Alto...com uma nuvem de fumo entre mim e a banda...o revirar dos copos acompanham as canções tristes e melancólicas...a voz e o piano carregam o peso de todas as desilusões de todos os presentes...o corpo de gata desliza felinamente por entre os olhos de quem se sente preso ao olhar desse animal de palco...a banda acelera e, agora, o revirar das garrafas acompanha a expiação da tristeza e da melancolia...na tasca, os ouvidos estão entregues à música, imperfeita mas forte, entregues à voz, complexa mas sentida...O ambiente é húmido, os corpos estão suados e embriagados...a festa não tem plano que a anteceda, é deixar a banda tocar e deixar que nos toque...sentir o seu efeito no corpo e na mente...no fim é fechar os olhos e guardar cá dentro tudo o que se passou nessa noite...para aquecer o espírito na noite fria...para nos relembrar que estamos vivos...que não somos perfeitos nem queremos ser...
No final de um concerto poderoso, Cat Power, ao vivo e a cores em Lisboa, abraçada por uma chuva de aplausos...Porque afinal a malta gostou...E eu também...!

Sem comentários: